
A reação do campo progressista diante do aumento da taxa Selic no último Copom, sob a gestão do bolsonarista Campos Neto — exasperada, furiosa e vingativa —, trouxe-me algumas reflexões.
Lembro-me da época em que Collor propôs a abertura comercial do mercado brasileiro à concorrência externa. Lembro-me de ir ao supermercado e encontrar vassouras importadas, das mais simples e mixurucas. Foi um choque, um sinal de que estávamos encrencados. E, de fato, foi um desastre. Mas hoje, quando Lula assina e promove um acordo de livre comércio com a União Europeia, sob severas críticas da esquerda, pergunto-me: será que Collor estava completamente errado? Talvez ele tenha exagerado na dose, talvez tenha agido sem planejamento e critérios. Talvez a época fosse inadequada. O resultado foi desastroso, mas a ideia, em si, nem tanto.
Depois, vieram os tucanos, com FHC e as privatizações: aeroportos, telefonia, estradas. Algo que o presidente Lula ainda faz e que Dilma também realizou, mas que, na era FHC, parecia uma loucura para nós.
Então, o que condenamos foi a desonestidade nas privatizações tucanas? Elas foram mal feitas? Hoje estão melhores? Que setores o Estado precisa manter sob seu controle? Há um debate sério sobre isso? Não parece haver mais limites para essas decisões, mas sim uma curva de aprendizado, com controles maiores e problemas recorrentes, como corrupção.
Concordo que avançamos muito em concessões, contratos e controles. Porém, a ideia central das privatizações veio da época tucana e, hoje, parece ser amplamente aceita. Ou será que não?
(Alckmim agora é bom? Antes não era?)
Será que falta correlação de forças ? Creio que não. A ideia de um Estado inchado, sobre tudo e todos, parece ter ficado para trás. Hoje, buscamos preservar setores estratégicos, que mudam ao longo do tempo, enquanto seguimos em frente. Que as polícias e os juízes façam sua parte, que os consumidores se organizem e que os políticos sejam supervisionados. Assim funciona uma democracia moderna.
Nosso maior desafio talvez esteja na comparação com países que não escolhem seus líderes periodicamente, como China e Rússia, o que lhes permite planejar suas políticas a médio e longo prazo. Enquanto isso, em democracias liberais como a nossa, governantes revezam-se entre fazer e desfazer. Mesmo assim, prefiro continuar em uma democracia, mas precisamos evitar esse pêndulo que vai de um extremo ao outro — é um atraso de vida.
Onde quero chegar?
No aumento dos juros e na reação do campo progressista. Não se trata de estarmos sempre certos, honestos e infalíveis, ignorando ou criminalizando opiniões divergentes. Estamos deixando de ouvir os outros.
Foi o boicote o único motivo da subida astronômica dos juros? Só isso basta para quebrar a política econômica do atual governo, mesmo sabendo que, em breve, a direção do Banco Central será inteiramente indicada pelo atual governo? A nova diretoria desfará tudo que Campos Neto e sua gestão fizeram? A resposta é não. Não desfará.
Além disso, o aumento de 1% na Selic, previsto para janeiro, vai acontecer . Aposto. O previsto para março está recomendado, mas não garantido, dependendo de análises mais adiante.
Se continuarmos surdos ao debate, a frustração com a nova diretoria do Banco Central será inevitável. E, por extensão, com Haddad e Lula também.
Precisamos entender as razões por trás das medidas duras, sejam elas do BC ou das políticas de contenção orçamentária para cumprir o arcabouço fiscal. É essencial compreender os mecanismos econômicos, superar os limites, enfrentar dificuldades e evitar armadilhas. Fazer o Brasil crescer com soberania, inclusão e distribuição de renda. Esse é o diferencial. Essas são as propostas. Como fazer isso? Varia de tempos em tempos, e ninguém detém o monopólio da verdade, da honestidade ou da razão.
Quanto aos juros, aguardo as decisões de Trump, que podem agitar o mercado mundial e valorizar o dólar. Para nós, considerando a trajetória em que estávamos, isso seria desastroso sem as medidas preventivas agora.
Uma pausa estratégica para acumular energia é, neste momento, a decisão mais acertada.
Sem histeria. Em algumas semanas, saberemos para onde seguir.