
Não passa despercebida a mudança no comportamento do Brasil no cenário internacional, e não estamos falando apenas de Venezuela, Nicarágua e BRICS, temas que têm gerado espanto em alguns e perplexidade em outros.
No caso da Venezuela, acompanhamos de perto a escalada das cobranças do Brasil pela realização de eleições, que culminou com o não reconhecimento do resultado, pois as atas de votação não foram disponibilizadas para conferência.
Embora essa questão tenha gerado discussões internas, um ponto crucial ainda não recebeu a devida atenção e talvez seja o mais incômodo de todos: o alinhamento do Brasil com os Estados Unidos em relação ao resultado venezuelano. Os EUA votaram de acordo com suas próprias posições, mas gradualmente foram assumindo uma postura em total concordância com a do Brasil, que até publicamente reconheceu esse alinhamento durante o processo.
A questão da Nicarágua teve menos destaque, mas a reação do Brasil, expulsando um diplomata nicaraguense, foi vista como desproporcional aos fatos conhecidos, destoando da tradicional diplomacia brasileira, historicamente paciente.
Chegamos então ao caso dos BRICS. Sem considerar a ausência de Lula, devido ao acidente doméstico recente, a presença brasileira no encontro de grande importância foi marcada pelo veto à entrada da Venezuela no grupo, representando mais um capítulo complexo nas relações com o país vizinho.
Pode-se atribuir a postura brasileira em relação à Venezuela ao papel de mediador que o Brasil assumiu no tratado de Barbados, entre oposição e governo de Maduro, acordo que previa eleições e um alívio nas sanções econômicas contra a Venezuela. No entanto, a alegação é de que os acordos não foram cumpridos, justificando as decisões subsequentes do Brasil. Mesmo assim, a posição brasileira tem escalado, chegando ao ponto de vetar a entrada da Venezuela nos BRICS, uma medida que foi dolorosamente sentida pelo país vizinho.
As declarações de Celso Amorim, assessor especial do presidente, não deixam totalmente claras as motivações do Brasil nessa guinada em sua política externa, que agora acompanha potências ocidentais e parece romper com décadas de cooperação mútua no continente.
Há especulações de que a mudança na postura brasileira tenha ligação com a relação bilateral com os EUA, especialmente com a possibilidade de vitória de Donald Trump nas próximas eleições. A postura brasileira, usando a Venezuela como um possível escudo de negociação, pode estar servindo para apaziguar relações, mesmo que de forma temporária, uma vez que Trump é imprevisível. Com o resultado das eleições nos EUA, poderemos compreender melhor as escolhas e os movimentos atuais do Brasil.
A entrada de Cuba nos BRICS também chama atenção, embora o tema tenha recebido pouca até o momento. Talvez isso ocorra pelo fato de que a ilha não é mais vista como uma ameaça significativa para os EUA, que inclusive permitem ajuda humanitária para aliviar a crise de apagões em Cuba.
Embora não tenhamos sinais definitivos, há sim uma inflexão do atual governo em direções inéditas, priorizando uma aproximação com os EUA e o Ocidente em detrimento dos BRICS. Circulam notícias de que o Brasil não ingressaria na Nova Rota da Seda chinesa, embora tenham sido desmentidas e o tema ainda siga indefinido. Em contrapartida, Lula tem promovido abertamente o acordo entre União Europeia e Mercosul, marcando contraste com outras negociações em curso.
Talvez o presidente Lula esteja buscando uma posição mais pró-Ocidente, procurando distanciar o Brasil do ambiente conturbado de disputas comerciais e até mesmo de conflitos armados que marcam o cenário mundial atual. Talvez ele esteja tentando resguardar os interesses nacionais dos excessos ideológicos, adotando um pragmatismo econômico essencial para o Brasil neste momento. Ou, quem sabe, o presidente tenha alterado sua visão sobre alinhamentos estratégicos, sentindo agora a necessidade de se posicionar de forma mais clara.
São muitas as perguntas ainda sem resposta, todas dependentes de soluções que promovam justiça, progresso e que preservem os interesses e mercados para o Brasil, alavancando nosso crescimento em meio aos desafios. Tudo parece condicionado, enquanto o Brasil tenta equilibrar pressões e manter acordos, na expectativa de que o cenário se torne menos incerto e que nossa posição, até para nós, se torne mais clara e menos volátil.
Enquanto isso, confiamos nas decisões e aguardamos os melhores resultados, ainda que, admito, sem entender todos os passos até aqui.