Os dois principais livros sobre a guerra dos Canudos, que eu saiba, um do brasileiro Euclides da Cunha e o outro do Peruano Vargas Lhosa, tem discursos opostos dos lados envolvidos no conflito.

Euclides fez jornalismo, acompanhou as tropas enviadas ao local da disputa e narrou o que viu e ouviu dos oficiais e soldados, obviamente, do lado de fora da cidadela que o exército dizimou.

Vargas Lhosa fez ficção, escrevendo como se de dentro da cidade de Canudos um observador descrevesse os fatos.

Gosto muito dos dois livros, o de Euclides, evidentemente, é o mais histórico e próximo dos fatos e serviu de principal referência para a ficção de Lhosa.

Um dos motivos que provocou a unidade dos canudos, sem considerar aspectos econômicos, foi a recusa de aceitar o casamento civil em substituição ao religioso, decisão dos republicanos após afastarem o rei D Pedro II e no contexto de afirmação do poder civil nascente.

Também o protesto contra o fim da monarquia era uma bandeira dos Canudos, mais, até onde recordo, exatamente por conta da criação do registro civil.

Não sei de qual dos livros tirei essa informação, preferiria se fosse do livro de Euclides, mas não afirmo.

Volta e meia a lembrança dessa guerra retorna, porque foi uma guerra de um tempo novo que queria impor-se e o velho que recusava-se a ir.

Evidente que era também uma guerra dos ricos contra os pobres, daqueles que exigem fazer mudanças, à força se necessário, contra os que sentem as mudanças como ameaças, vindas de fora e impostas sem que a compreensão anteceda o fato.

Muitos são os canudos desse Brasil, o nome do morro da cidade, o morro da Favela, eternizou-se nas paisagens e no modo de vida dos excluídos de todas as grandes cidades do país.

Lá, ainda hoje, milhões de canudos ainda pouco compreendem as bruscas mudanças dos poderosos, suas tentativas inúteis de melhorar a vida.

Ainda hoje os canudos sofrem, esmagamos pelas mesmas mãos, os mesmos motivos, sem que isso sirva para nada e ninguém.

Nem eles ganham, nem nós.

O Brasil da inclusão passou na janela e nenhum dos canudos viu.

Passará novamente?